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Crise no campo

Gigante em apuros: por que o agro de Mato Grosso bate recordes de produção e de pedidos de recuperação judicial

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Aumento de 345% nos pedidos de produtores e casos emblemáticos com dívidas milionárias revelam a fragilidade financeira por trás da safra recorde.

Mato Grosso, o celeiro do Brasil, vive um paradoxo brutal. Enquanto o estado se prepara para colher mais uma safra recorde, consolidando-se como o maior produtor de grãos do país pelo 14º ano consecutivo, um tsunami silencioso de endividamento arrasta produtores e empresas para os tribunais. O número de pedidos de recuperação judicial de produtores rurais pessoa física no estado explodiu 345% em 2024, superando sozinho todo o volume registrado no Brasil no ano anterior. É a crônica de uma crise que opõe a pujança da porteira para fora à asfixia financeira da porteira para dentro.

 

A tempestade perfeita

 

A conta, para muitos, simplesmente não fecha mais. O cenário que empurrou o campo para essa situação é uma combinação de fatores que, juntos, formaram o que especialistas chamam de “efeito tesoura”: as receitas caem, mas os custos continuam subindo. De um lado, a queda drástica nos preços das commodities. A saca de soja, que em 2022 bateu o pico de R$ 191,50, hoje é negociada abaixo de R$ 125 em diversas praças de Mato Grosso. Do outro, os custos de produção não dão trégua, pressionados por insumos caros e uma taxa Selic estacionada em 15% ao ano, que torna o crédito rural um artigo de luxo.

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O resultado é um esmagamento das margens de lucro. Em Mato Grosso, o custo médio por hectare já ultrapassa os R$ 7.100. Isso significa que um produtor precisa colher quase 64 sacas de soja apenas para empatar, sem contar qualquer remuneração pelo capital investido. Some-se a isso as perdas de produtividade causadas por eventos climáticos extremos, como a seca que marcou a safra 2023/24, e o desastre financeiro se torna quase inevitável para quem entrou no ciclo mais alavancado.

 

Retratos da crise: de Bergamasco a LD

 

A crise não escolhe tamanho nem história. Em 20 de outubro de 2025, a Justiça homologou o plano de recuperação do Grupo Bergamasco, um conglomerado familiar com mais de 50 anos de tradição, que acumula dívidas de R$ 236 milhões. A decisão do juiz Márcio Aparecido Guedes, da 1ª Vara Cível de Cuiabá, foi justificada pela “evidente utilidade para a preservação da atividade empresarial”. O grupo, fundado em 1995 no estado, foi vítima de uma sequência de infortúnios: seca severa em 2017, alta dos juros, os impactos da pandemia e até um incêndio acidental que feriu gravemente o patriarca, José Osmar Bergamasco.

Um mês antes, em setembro, foi a vez do Grupo LD, um complexo de 12 empresas e sete produtores das famílias Doerner e Lopes, ter seu pedido de recuperação judicial deferido em Sinop. O passivo, neste caso, é ainda maior: R$ 375 milhões. O juiz Cristiano dos Santos Fialho reconheceu a “confusão patrimonial” entre as empresas — que atuam desde a mineração de granito e logística fluvial até a produção de soja e gado — e determinou a suspensão de todas as execuções contra o grupo por 120 dias, blindando maquinários e a Fazenda Alvorada II, considerada essencial para a continuidade das operações.

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A advogada que conduz o caso, Ramirhis Laura Xavier Alves, afirmou que “a perícia confirmou a plena viabilidade do grupo”, e que a medida é essencial para a renegociação das dívidas. Outros casos, como o do Grupo Correa da Costa, com dívidas de R$ 80 milhões, e o do Grupo RD, ligado à Randon, se somam à lista crescente, pintando um retrato sombrio da realidade financeira no campo mato-grossense.

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O dedo na ferida: a polêmica da “advocacia predatória”

 

Diante da avalanche de processos, o Banco do Brasil, principal credor do agronegócio, partiu para o contra-ataque. A instituição financeira passou a denunciar o que classifica como “advocacia predatória”, acusando escritórios de advocacia de incentivar produtores a buscar a via judicial sem antes tentar uma renegociação amigável. “Percebemos que muitos advogados estão vendendo sonhos para ruralistas, dizendo que eles resolveriam todas as suas questões financeiras”, declarou Geovanne Tobias, vice-presidente do banco, ainda em novembro de 2024.

A retórica subiu de tom em agosto de 2025, quando a presidente do BB, Tarciana Medeiros, anunciou que o banco acionaria judicialmente os escritórios que estivessem usando a recuperação judicial de forma “ostensiva”. “Nosso jurídico está analisando os escritórios que estão orientando de forma ostensiva contra o Banco do Brasil”, afirmou Medeiros, apontando que alguns estariam até fazendo propaganda em redes sociais para que os produtores não pagassem suas dívidas.

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A crise, no entanto, cobrou seu preço no balanço da instituição. No primeiro trimestre de 2025, o BB reportou um lucro de R$ 7,4 bilhões, uma queda de 20% em relação ao ano anterior, resultado impactado diretamente pela provisão de R$ 5 bilhões para perdas no segmento agro. As ações do banco derreteram, resultando em uma perda de R$ 17 bilhões em valor de mercado em um único dia.

Especialistas e entidades do setor, por outro lado, veem a acusação como uma tentativa de deslegitimar um movimento que reflete uma crise estrutural. Breno Augusto Pinto de Miranda, presidente do IBAJUD, afirmou que “o aumento dos pedidos reflete, sobretudo, a intensificação das dificuldades no campo”. Para muitos, a recuperação judicial não é uma escolha, mas o único remédio disponível para empresas viáveis, mas momentaneamente estranguladas por dívidas.

 

Crédito caro e um Plano Safra insuficiente

 

A Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja MT) tem sido uma voz ativa na denúncia do aperto financeiro. A entidade criticou duramente o Plano Safra 2025/26, afirmando que, na prática, há menos dinheiro disponível. “Com juros próximos da taxa Selic atual, o crédito rural se torna praticamente inacessível para a maioria dos produtores”, destacou a associação em nota. Lucas Costa Beber, presidente da Aprosoja MT, foi direto: “Na prática, temos menos dinheiro disponível para contratar”.

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A entidade defende a securitização das dívidas, a criação de linhas emergenciais e a revisão de encargos financeiros como saídas para evitar um colapso ainda maior. Recentemente, a Aprosoja MT pediu ao Ministério da Agricultura que flexibilize os critérios da Medida Provisória 1.314/2025, que permite a renegociação de dívidas com juros subsidiados, alegando que as regras atuais excluem muitos produtores mato-grossenses afetados.

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Diego Bertuol, diretor da entidade, cobrou o ministro Carlos Fávaro para que “modifique os critérios e enquadre os produtores do Mato Grosso”, mostrando coerência com a gravidade da “maior crise financeira do agro brasileiro”.

 

Uma crise sistêmica?

 

A explosão de recuperações judiciais acende um alerta que vai além das fazendas. O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) já manifestou preocupação com os prejuízos que a desconfiança pode gerar em toda a cadeia produtiva. A indústria de insumos, que em 2023 financiou cerca de R$ 29 bilhões em defensivos, é um dos pilares do crédito no campo e pode ser duramente atingida.

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O temor é de um efeito cascata, com redução do crédito, maior seletividade dos bancos e impacto direto em fornecedores, tradings e cooperativas. O que acontece hoje em Mato Grosso é um sintoma agudo de uma doença que parece contaminar o modelo de negócio do agro brasileiro, altamente dependente de crédito e vulnerável a oscilações de mercado e clima. A grande questão que fica no ar é se a recuperação judicial será um remédio eficaz para salvar empresas ou apenas um paliativo antes de um tombo ainda maior.


Para entender melhor:

  • Recuperação Judicial (RJ): É uma medida legal que permite a empresas e produtores rurais endividados reorganizarem suas finanças e evitarem a falência. Durante o processo, as dívidas são congeladas e um plano de pagamento é negociado com os credores sob supervisão da Justiça.
  • Consolidação Substancial: Um procedimento jurídico dentro da recuperação judicial em que os ativos e passivos de diferentes empresas ou pessoas de um mesmo grupo são unificados e tratados como uma única entidade. Isso geralmente ocorre quando há uma forte interligação e “confusão patrimonial” entre eles.
  • Barter: Termo em inglês para uma operação de troca. No agronegócio, é muito comum o produtor trocar parte de sua produção futura (soja, milho) por insumos (fertilizantes, sementes, defensivos) no início da safra.
  • Plano Safra: Programa anual do Governo Federal que destina recursos para o financiamento da produção agropecuária no Brasil, definindo volumes de crédito, taxas de juros e condições para custeio, investimento e comercialização.
  • Taxa Selic: A taxa básica de juros da economia brasileira, definida pelo Banco Central. Ela serve de referência para todas as outras taxas de juros do país, incluindo as do crédito rural.
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AGRONEGÓCIO

Exportações de Carne Bovina do Brasil em Outubro Já Superam Todo o Volume de 2024

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As exportações brasileiras de carne bovina seguem em ritmo acelerado em outubro de 2025. Até a quarta semana do mês, os embarques somaram 276,5 mil toneladas, segundo dados divulgados nesta terça-feira (28) pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

O volume parcial já supera o total exportado em outubro de 2024, quando foram registradas 270,2 mil toneladas enviadas ao exterior.

Avanço nas Exportações e Crescimento da Média Diária

A média diária de carne bovina exportada neste mês atingiu 15,4 mil toneladas, representando um aumento de 25% em comparação com o mesmo período do ano anterior, quando a média foi de 12,2 mil toneladas diárias.

Esse desempenho reforça o bom momento do setor, sustentado pela forte demanda internacional e pela competitividade da carne brasileira no mercado externo.

Receita das Exportações Ultrapassa US$ 1,5 Bilhão

O faturamento total com as exportações de carne bovina até a quarta semana de outubro chegou a US$ 1,527 bilhão, valor superior ao registrado no mesmo mês de 2024, que foi de US$ 1,259 bilhão.

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Na média diária, o setor arrecadou US$ 84,88 milhões, um avanço expressivo de 48,2% em relação ao resultado de outubro do ano passado (US$ 57,26 milhões por dia).

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Preços Médios da Carne Bovina Também Registram Alta

Além do aumento no volume exportado e na receita, os preços médios da carne bovina também apresentaram crescimento. Até a quarta semana de outubro, o valor médio pago pela tonelada foi de US$ 5.525,8, um ganho de 18,5% em comparação a outubro de 2024, quando o preço médio estava em US$ 4.661,7 por tonelada.

Esse avanço reflete a valorização da proteína brasileira no mercado internacional, impulsionada pela demanda aquecida em destinos como China e Oriente Médio, principais compradores do produto.

O resultado parcial de outubro confirma a tendência de forte desempenho das exportações brasileiras de carne bovina em 2025, tanto em volume quanto em valor, consolidando o Brasil como um dos principais fornecedores globais de proteína animal.

Fonte: Portal do Agronegócio

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Fonte: Portal do Agronegócio

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